Desde o primeiro exemplar, a saga dos “Piratas do Caribe” mostrou-se como um oportuno produto do seu tempo. Cada um dos filmes está contaminado por tudo aquilo que o seu público-alvo anseia. Histórias rocambolescas e efeitos especiais atraentes são o bastante para satisfazer as taras por inovações do seu espectador e, por conseqüência, ludibriá-lo com isso ao ponto de tornar irrelevante a falta de substância das obras.
Ao mesmo tempo em que dispõe de atrativos para agradar facilmente o seu público, a série se impõe como um reflexo dessa cultura ao qual se insere. A cultura ao qual se insere esses piratas é a da infantilização do ser humano e ela se percebe quando descobrimos que a franquia foi inspirada numa atração de um parque de diversões. Só isso basta para constatar a infantilidade do projeto e também a imaturidade do público que vibra com ele.
Os defensores dos “Piratas do Caribe” costumam usar o prestígio de Johnny Depp como ator para justificar o injustificável. Dizem que o filme é bom por não se levar a sério e que o ator é o responsável por esse suposto despojamento, emprestando sua própria excentricidade para compor a caricatura do seu personagem.
Esse argumento é válido parcialmente. Primeiro porque se há graça nessa balbúrdia, essa comicidade existe por ser uma novidade, já que possivelmente foi a primeira vez que Johnny Depp se despiu de qualquer senso de ridículo.
Ver pela primeira vez o ator caminhar daquela maneira desequilibrada e afetada, com os braços estendidos ao alto como se fosse um equilibrista ébrio, pode realmente ser algo muito cômico. Mas não é um humor que se sustenta por quatro longuíssimos filmes. Na enésima vez, já não queremos rir, mas arrancar a poltrona no cinema com as unhas por gastar vinte mangos num divertimento tão rasteiro.
E o problema dos “Piratas do Caribe” é esse. Os filmes dependem demais da inspiração do seu ator para atrair o público. É uma combinação manjada e irritante de exibicionismos: o do ator e dos efeitos especiais contidos nas produções.
Se o ator faz uma paródia de si mesmo, dessa imagem de “o estranho” ao qual se tornou ícone, o filme não vai mais longe ao tentar fazer uma sátira de desgastadas lendas de um velho gênero, dos filmes de capa e espada.
Se ao menos essa franquia servisse para que os espectadores se interessassem pelos artigos reais – os filmes clássicos do Errol Flynn - e não se contentassem com as meras imitações, como essas versões contemporâneas e modorrentas, já seria o suficiente para enaltecer a existência dela.
Só que o público se contenta com muito pouco. Deleita-se com um punhado de barulho, piadas manjadas, efeitos especiais de última geração. Com isso, fica claro que o público recebe o filme que merece. São cúmplices em suas mediocridades.
Eu recuso “Piratas do Caribe” por princípio. Não acho possível admirar um filme inspirado num parque de diversões. Ser favorável a isso é ignorar o quanto o entretenimento do século XXI se rebaixou.
Quando o cinema era capaz de oferecer diversão de qualidade, daquela que não subestimaria o nosso intelecto ou nos tomaria por débeis mentais, as aventuras fornecidas pelo cinema tinham como fonte de inspiração a literatura de um Alexandre Dumas ou Herman Melville. Hoje nos inspiramos num brinquedo de Play Center? Acho que não evoluímos muito. Talvez para a condição de eqüino.
Não parece mera coincidência a narrativa de este quarto episódio concentrar-se na busca dos personagens pela fonte da juventude. Os piratas querem tanto rejuvenescer quanto os produtores desejam infantilizar o espectador, para que ele aceite de braços abertos toda a porcaria oferecida a ele.
“Piratas do Caribe - Navegando em Águas Misteriosas” é isso: um produto desgastado que insiste em ser jovem. E como bem disse Nelson Rodrigues, “a juventude é um mal que passa”. Espero que isso seja verdade.
* Texto publicado na Folha da Região do dia 09 de junho de 2011.
* Texto publicado na Folha da Região do dia 09 de junho de 2011.
2 comentários:
A saga poderia não ter sido uma saga, poderia ter parado no 1o filme, já tava bom. O filme fez sucesso, mostrou Johnny Depp numa comicidade e excentricidade diferente e apostou nos efeitos especiais. Um blockbuster, apenas. Tava ótima, mas essa de criar saga tirou um pouco dessa surpresa toda realmente. Imagina agora que já estamos no 4o filme, e ainda vem o 5o por aí... Talvez, sei lá, se querem tanto ver o Jack Sparrow, sei lá, criem um seriado cômico pra ele, daqueles de 30 minutos, com 20 episódios por temporada, acho que seria mais interessante do que voltar a colocá-lo num filme de mais de duas horas de duração. Quanto à inspiração, eu acho válido, as ideias brotam de qualquer coisa, isso pra mim é uma qualidade e não um defeito, mas é questão de opinião. Ahhh, só pra constar, não vi o filme ainda, e não to com vontade de ver! Espero que o Tim Burton não aceite dirigir o 5o filme.
Essa ideia de transformar o filme em seriado é uma boa. Eu assisti apenas - se não me engano - ao segundo, porém, pelo que pude captar da crítica feito pelo Diego, o melhor seria isso mesmo.
Essa banalização da comédia, prendendo toda a comicidade ao personagem principal e às piadas feitas em torno dele, ficaria menos desgastante em um seriado, fazendo-se ainda o favor de elimar os efeitos especiais.
Arrisco-me a dizer que "Two and a a Half men" segue esse mesmo esquema, só que menos "pastelão".
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